terça-feira, 21 de junho de 2016

EDIFICADOS NA SANTÍSSIMA FÉ

Judas encerra a sua carta descrevendo quais as ações que os crentes devem fazer para se manter fiéis ao Senhor e não serem enganados pelos falsos mestres, ou seja, demonstra como devemos batalhar pela fé que uma vez foi dada aos santos.
INTRODUÇÃO

- Judas, após ter mostrado ilustrações bíblicas e relembrado os ensinamentos apostólicos sobre os falsos mestres, faz uma exortação aos crentes diante destes falsos mestres, com sete recomendações: edificação sobre a fé, oração no Espírito, autoconservação no amor de Deus, esperança na misericórdia de Jesus Cristo para a vida eterna, piedade para com o irmão duvidoso, misericórdia para salvação de alguns do fogo, aborrecimento até da roupa manchada da carne.(Jd.20-23).

OBS: "...Numa recomendação final, o autor relembra os pontos fundamentais de um programa da vida cristã: fé, oração, amor, auxílio mútuo, confiança na misericórdia de Jesus Cristo e distância daqueles que procuram perverter os outros..." (Bíblia Sagrada, Edição Pastoral, nota a Jd. 20-23, p.1588).

- Judas encerra sua carta lembrando os irmãos da necessidade de uma vida livre de tropeços e com apresentação irrepreensível, com alegria, em virtude do poder de Deus, que é o único Senhor e dominador de todas as coisas(Jd.24,25).


I. O QUE É A FÉ
- Judas apresenta como primeira recomendação aos crentes a edificação na santíssima fé.

OBS: "...Os crentes devem defender e propagar a fé e resistir aos falsos ensinos, de quatro maneiras: (1)Edificando-se santíssima fé. A santa fé é a revelação divina do NT, transmitida por Cristo e pelos apóstolos (v.3). Isso requer o estudo da Palavra de Deus e um esforço resoluto para conhecer a verdade e os ensinos das Escrituras (cf.At.2.42; 20.27;Hb.5.12; 2Tm.2.15).(2) Orando no Espírito. Devemos orar no poder eficaz do Espírito Santo, i.e., confiando no Espírito Santo para inspirar, orientar, energizar, sustentar e nos ajudar a lutar em oração(...cf.Gl.4.6; ef.6.18). Orar no Espírito inclui, tanto orar com a mente, quanto orar com o nosso espírito...(3) Permanecendo na esfera do amor de Deus por nós. Isso envolve obediência leal a Deus e à sua Palavra(Jo.15.9,10).(4) Almejando e aguardando a volta de nosso Senhor e a glória eterna que acompanhará a Sua volta..."( Bíblia de Estudo Pentecostal, nota a Jd. 20,21, p.1976).

- A fé é um dom de Deus (Ef.2:8), que vem pelo ouvir pela palavra de Deus(Rm.10:17), sem a qual ninguém poderá agradar a Deus(Hb.11:6). Mediante a fé podemos crer em Deus e reconhecer que Ele é o galardoador dos que O buscam, ou seja, reconhecemos que Deus é o Senhor do Universo e que Suas promessas serão cumpridas integralmente e, por isso, passamos a viver segundo a Sua vontade.

- Embora a fé tenha origem em Deus, o seu desenvolvimento deve se dar em cada um de nós, pois o crer é resultado de nossa vontade, de nosso livre-arbítrio. Daí porque o escritor aos Hebreus ter falado dos "heróis da fé", ou seja, a fé é exercida e desenvolvida pelos homens, embora tenha sua origem em Deus -Hb.11.

- A fé é algo que pode ser aumentado (Lc.17:5). Temos de edificar a nossa fé, fazê-la crescer, o que somente se poderá dar em santidade(Lv.11:44; 19:2;20:7; IPe.1:13-16). Neste passo, Judas mostra a falsidade dos ensinamentos dos mestres gnósticos, que entendiam que o "conhecimento" que conferia salvação independia de uma vida de santidade, de separação do pecado. Precisamos fugir de ensinamentos que menosprezam a santidade, que já se enveredavam pelo perigoso caminho do "não faz mal" (cf.Ml.1:7-9).

- A edificação é uma tarefa individual, de cada crente. É um esforço que cada um deverá fazer, tendo como alicerce a fé, a crença em Deus, fé que é o segredo da nossa vitória -Js.1:6-9; IJo.5:4,5.


II. COMO SER EDIFICADOS NA FÉ

- Diz Judas que a edificação se deve mediante uma oração no Espírito. A oração deve ser uma constante na vida do crente. Não se pode vencer sem que se tenha oração - I Ts.5:17; Lc.18:1;21:36.

OBS: "...'Oro com o espírito' significa orar em línguas sob o impulso do Espírito Santo. O espírito do crente ora à medida que o Espírito Santo o capacita a falar (cf. 12.7,11;At.2.4). Paulo fala aqui do uso pessoal de línguas dirigidas a Deus. Paulo usava as línguas, não somente para orar, mas também para cantar, para louvar, para dar graças a Deus (vv.14-16). 'Orar com o entendimento' significa orar e louvar a Deus através da nossa própria mente, numa língua aprendida, mas também sob o impulso do Espírito..." (Bíblia de Estudo Pentecostal, nota a I Co.14.15, p.1761).

- A oração no Espírito é a oração do justo (Tg.5:16), a oração de alguém que tem comunhão com Deus(Rm.8:1,9,14,16). Não é uma reza, um mantra, mas a expressão de uma vida íntima com Deus.

OBS: "...'E, orando, não useis de vãs repetições, como os gentios, que pensam que, por muito falarem, serãoouvidos.(Mateus 6,7)...O mundo está cheio de pessoas que se dizem evangélicas praticantes sem saber o que significa essa maravilhosa oração (o Pai nosso, observação nossa). Por que não sabem ? Exatamente porque não observam esses quatro versículos de advertência(Mt.6:5-8, observação nossa). Sem fazer isso, dificilmente descobriremos o seu verdadeiro significado. O que deve ser vã repetição ? Vã é tudo que não tem valor real, é como um espaço sem energia, é como uma caixa vazia, às vezes bonita, porém sem valor algum. São assim as supostas orações repetidas perante os ouvidos do Senhor. Isso não passa de reza...Quando estamos orando, estamos, de fato, falando com Deus.. Quando estamos rezando, estamos apenas falando para os homens, ou para ninguém, uma vez que os nossos próprios ouvidos nunca ouvem o que dizemos, é por isso que não aprendemos conosco mesmos...Rezas são frases decoradas por alguém (assim como Salat no islamismo), são como uma máquina que foi programada para fazer uma única coisa, repetitivamente quantas milhares de vezes for possível...Para Deus, um homem ou um papagaio rezando, não faz diferença, ambos estão com as mentes mecanizadas. Cristo destituiu esta forma de se enganar os homens na cruz do Calvário..."(Ailton M. de CARVALHO. Maomé X Cristo, p.298-300)

- A terceira atitude recomendada por Judas é a autoconservação no amor de Deus. Judas diz que o crente deve se manter no amor de Deus. Ora, somente nos manteremos no amor de Deus, se observarmos a Sua Palavra -Jo.15:9,10,14; IJo.4:7,8.

- A quarta atitude recomendada por Judas é a esperança da misericórdia de Jesus para a vida eterna - o crente deve ter a mesma consciência do profeta de que a misericórdia do Senhor é a causa de não termos sido consumidos(Lm.3:3:22). Quem se conscientiza da ilimitada misericórdia de Deus, passa a ser humilde, reconhece sua pequenez diante do Senhor e que foi salvo pela graça e não por seus méritos(Ef.2:8,9). Somos alvo de um favor imerecido de Deus e, diante disto, não podemos nos considerar superiores a qualquer outro ser humano(Fp.2:3). Somente assim, evitaremos fazer julgamentos dos semelhantes(Tg.4:11,12).

OBS: "...Neste grande edifício de Deus, neste enorme templo do Espírito Santo, neste gigantesco corpo de Cristo, podemos nos considerar apenas um grão de areia. É imprudente alguém se considerar grande na Igreja, pois sua grandeza é acima do que podemos imaginar e cada membro que a compõe não passa de grão de areia na proporção gigantesca que é a Igreja..." (Osmar José da SILVA. Reflexões filosóficas de eternidade a eternidade, v.6, p.111)

- A quinta atitude recomendada por Judas é a piedade para com o irmão duvidoso. A Bíblia nos ensina que devemos ter um comportamento de compaixão pelos irmãos mais fracos, a fim de contribuirmos para o seu fortalecimento -Rm.14; ICo.8:9,11; 9:22; Hb.9:12-13; Jó 4:3,4; Is.35:3. Entretanto, é lamentável ver que muitos contribuem para a morte espiritual do fraco, pois, ao invés de ter piedade, compaixão, acabam por lançar o fraco na negrura das trevas, sendo verdadeiros assassinos de almas, que terão de prestar contas naquele grande dia. Ai deles !

OBS:
"...É importantíssimo que os pastores também sejam evangelistas e saibam quanto custa ganhar uma alma para Cristo, pois só assim tratarão o rebanho do Senhor com todo o cuidado, evitando que se desgarrem e muito menos usar de arrogância, como se fossem donos da Igreja, lançá-las fora por qualquer motivo..." (Osmar José da SILVA. Reflexões filosóficas de eternidade a eternidade, v.6, p.115).
"...Advirta, exorte e salve os outros do erro quando possível. Não permita que os outros caiam quando você pode evitar isso...." (Bíblia de Estudo Plenitude, Verdade em ação no Livro de Judas, versículo 23, p.1337).


III. ARREBATAI-OS DO FOGO

- A sexta atitude recomendada por Judas aos crentes é o arrebatamento dealguns do fogo. Não basta apenas ter compaixão com os fracos, mas é precisoarrebatar alguns do juízo divino, da ira de Deus. O crente deve, sempre,evangelizar, buscar, com sua vida e com suas palavras, trazer vidas preciosaspara o Senhor.

OBS: Neste passo, devemos aqui trazer à memória uma das mais belas páginasde nossa literatura, o Sermão da Sexagésima, do Pe. Antonio Vieira, "inverbis": "... A definição do pregador é a vida e o exemplo. Porisso Cristo no Evangelho não o comparou ao semeador, senão ao que semeia.Reparai. Não diz Cristo: saiu a semear o semeador, senão, saiu a semear o quesemeia: Ecce exiit, qui seminat, seminare. Entre o semeador e o que semeia hámuita diferença. Uma coisa é o soldado e outra coisa o que peleja; uma coisaé o governador e outra o que governa. Da mesma maneira, uma coisa é o semeadore outra o que semeia; uma coisa é o pregador e outra o que prega. O semeador eo pregador é nome; o que semeia e o que prega é ação; e as ações são asque dão o ser ao pregador. Ter o nome de pregador, ou ser pregador de nome, nãoimporta nada; as ações, a vida, o exemplo, as obras, são as que convertem oMundo. O melhor conceito que o pregador leva ao púlpito, qual cuidais que é?-- o conceito que de sua vida têm os ouvintes. Antigamente convertia-se oMundo, hoje porque se não converte ninguém? Porque hoje pregam-se palavras epensamentos, antigamente pregavam-se palavras e obras. Palavras sem obra sãotiros sem bala; atroam, mas não ferem... Por isso Cristo comparou o pregador aosemeador. O pregar que é falar faz-se com a boca; o pregar que é semear,faz-se com a mão. Para falar ao vento, bastam palavras; para falar ao coração,são necessárias obras. Diz o Evangelho que a palavra de Deus frutificou centopor um. Que quer isto dizer? Quer dizer que de uma palavra nasceram cempalavras? -- Não. Quer dizer que de poucas palavras nasceram muitas obras. Poispalavras que frutificam obras, vede se podem ser só palavras! Quis Deusconverter o Mundo, e que fez? -- Mandou ao Mundo seu Filho feito homem. Notai. OFilho de Deus, enquanto Deus, é palavra de Deus, não é obra de Deus: Genitumnon factum. O Filho de Deus, enquanto Deus e Homem, é palavra de Deus e obra deDeus juntamente: Verbum caro factum est. De maneira que até de sua palavradesacompanhada de obras não fiou Deus a conversão dos homens. Na união dapalavra de Deus com a maior obra de Deus consistiu a eficácia da salvação doMundo. Verbo Divino é palavra divina; mas importa pouco que as nossas palavrassejam divinas, se forem desacompanhadas de obras... Porque convertia o Baptistatantos pecadores? -- Porque assim como as suas palavras pregavam aos ouvidos, oseu exemplo pregava aos olhos. As palavras do Baptista pregavam penitência:Agite poenitentiam. «Homens, fazei penitência» -- e o exemplo clamava: EcceHomo: «eis aqui está o homem» que é o retrato da penitência e da aspereza.As palavras do Baptista pregavam jejum e repreendiam os regalos e demasias dagula; e o exemplo clamava: Ecce Homo: eis aqui está o homem que se sustenta degafanhotos e mel silvestre. As palavras do Baptista pregavam composição e modéstia,e condenavam a soberba e a vaidade das galas; e o exemplo clamava: Ecce Homo:eis aqui está o homem vestido de peles de camelo, com as cordas e cilício àraiz da carne. As palavras do Baptista pregavam despegos e retiros do Mundo, efugir das ocasiões e dos homens; e o exemplo Clamava: Ecce Homo: eis aqui ohomem que deixou as cortes e as sociedades, e vive num deserto e numa cova. Seos ouvintes ouvem uma coisa e vêem outra, como se hão-de converter? Jacobpunha as varas manchadas diante das ovelhas quando concebiam, e daqui procediaque os cordeiros nasciam malhados. Se quando os ouvintes percebem os nossosconceitos, têm diante dos olhos as nossas manchas, como hão-de concebervirtudes? Se a minha vida é apologia contra a minha doutrina, se as minhaspalavras vão já refutadas nas minhas obras, se uma cousa é o semeador e outrao que semeia, como se há-de fazer fruto?..." (Antonio VIEIRA. O Sermão daSexagésima. www.ufscar.br/literatura).

- A expressão "arrebatamento" demonstra que é preciso esforço porparte do crente na tarefa de evangelização. Não que se tenha emprego de forçaou de violência para que se obtenha a conversão, mas a pregação do Evangelhode Jesus Cristo envolve um esforço da parte do cristão, porquanto se estarácontra o curso deste mundo (Ef.2:1-3),contra a vontade deste mundo (Jo.15:18-25)

OBS: Aqui também reproduzimos outro trecho do Sermão da Sexagésima,onde Vieira nos mostra que a pregação do Evangelho é ir contra o curso destemundo, "in verbis": "... Mas daqui mesmo vejo que notais (e menotais) que diz Cristo que o semeador do Evangelho saiu, porém não diz quetornou porque os pregadores evangélicos, os homens que professam pregar epropagar a Fé, é bem que saiam, mas não é bem que tornem. Aqueles animais deEzequiel que tiravam pelo carro triunfal da glória de Deus e significavam ospregadores do Evangelho que propriedades tinham? Nec revertebantur, cumambularent: «Uma vez que iam, não tornavam». As rédeas por que se governavamera o ímpeto do espírito, como diz o mesmo texto: mas esse espírito tinhaimpulsos para os levar, não tinha regresso para os trazer; porque sair paratornar melhor é não sair. Assim argúis com muita razão, e eu também assim odigo. Mas pergunto: E se esse semeador evangélico, quando saiu, achasse o campotomado; se se armassem contra ele os espinhos; se se levantassem contra ele aspedras, e se lhe fechassem os caminhos que havia de fazer? Todos estes contráriosque digo e todas estas contradições experimentou o semeador do nossoEvangelho. Começou ele a semear (diz Cristo), mas com pouca ventura. «Umaparte do trigo caiu entre espinhos, e afogaram-no os espinhos»: Aliud ceciditinter spinas et simul exortae spinae suffocaverunt illud. Outra parte caiu sobrepedras, e secou-se nas pedras por falta de humidade»: Aliud cecidit superpetram, et natum aruit, quia non habebat humorem. «Outra parte caiu no caminho,e pisaram-no os homens e comeram-no as aves»: Aliud cecidit secus viam, etconculcatum est, et volucres coeli comederunt illud. Ora vede como todas ascriaturas do Mundo se armaram contra esta sementeira. Todas as criaturas quantashá no Mundo se reduzem a quatro gêneros: criaturas racionais, como os homens;criaturas sensitivas, como os animais; criaturas vegetativas, como as plantas;criaturas insensíveis, como as pedras; e não há mais. Faltou alguma destasque se não armasse contra o semeador? Nenhuma. A natureza insensível operseguiu nas pedras, a vegetativa nos espinhos, a sensitiva nas aves, aracional nos homens. E notai a desgraça do trigo, que onde só podia esperarrazão, ali achou maior agravo. As pedras secaram-no, os espinhos afogaram-no,as aves comeram-no; e os homens? Pisaram-no: Conculcatum est. Ab hominibus (diza Glossa). Quando Cristo mandou pregar os Apóstolos pelo Mundo, disse-lhesdesta maneira: Euntes in mundum universum, praedicate omni creaturae: «Ide, epregai a toda a criatura». Como assim, Senhor?! Os animais não sãocriaturas?! As árvores não são criaturas?! As pedras não são criaturas?!Pois hão os Apóstolos de pregar às pedras?! Hão-de pregar aos troncos?! Hão-depregar aos animais?! Sim, diz S. Gregório, depois de Santo Agostinho. Porquecomo os Apóstolos iam pregar a todas as nações do Mundo, muitas delas bárbarase incultas, haviam de achar os homens degenerados em todas as espécies decriaturas: haviam de achar homens homens, haviam de achar homens brutos, haviamde achar homens troncos, haviam de achar homens pedras. E quando os pregadoresevangélicos vão pregar a toda a criatura, que se armem contra eles todas ascriaturas?! Grande desgraça! Mas ainda a do semeador do nosso Evangelho nãofoi a maior. A maior é a que se tem experimentado na seara aonde eu fui, e paraonde venho. Tudo o que aqui padeceu o trigo, padeceram lá os semeadores. Se bemadvertirdes, houve aqui trigo mirrado, trigo afogado, trigo comido e trigopisado. Trigo mirrado: Natum aruit, quia non habebat humorem; trigo afogado:Exortae spinae suffocaverunt illud; trigo comido: Volucres caeli comederuntillud; trigo pisado: Conculcutum est. Tudo isto padeceram os semeadores evangélicosda missão do Maranhão de doze anos a esta parte. Houve missionários afogados,porque uns se afogaram na boca do grande rio das Amazonas; houve missionárioscomidos, porque a outros comeram os bárbaros na ilha dos Aroãs; houve missionáriosmirrados, porque tais tornaram os da jornada dos Tocatins, mirrados da fome e dadoença, onde tal houve, que andando vinte e dois dias perdido nas brenhas matousomente a sede com o orvalho que lambia das folhas. Vede se lhe quadra bem oNotum aruit, quia non habebant humorem! E que sobre mirrados, sobre afogados,sobre comidos, ainda se vejam pisados e perseguidos dos homens: Conculcatum est!Não me queixo nem o digo, Senhor, pelos semeadores; só pela seara o digo, sópela seara o sinto. Para os semeadores, isto são glórias: mirrados sim, maspor amor de vós mirrados; afogados sim, mas por amor de vós afogados; comidossim, mas por amor de vós comidos; pisados e perseguidos sim, mas por amor de vósperseguidos e pisados. Agora torna a minha pergunta: E que faria neste caso, ouque devia fazer o semeador evangélico, vendo tão mal logrados seus primeirostrabalhos? Deixaria a lavoura? Desistiria da sementeira? Ficar-se-ia ocioso nocampo, só porque tinha lá ido? Parece que não. Mas se tornasse muito depressaa buscar alguns instrumentos com que alimpar a terra das pedras e dos espinhos,seria isto desistir? Seria isto tornar atrás?-- Não por certo. No mesmo textode Ezequiel com que arguistes, temos a prova. Já vimos como dizia o texto, queaqueles animaiis da carroça de Deus, «quando iam não tornavam»: Necrevertebantur, cum ambularent. Lede agora dois versos mais abaixo, e vereis quediz o mesmo texto que «aqueles animais tornavam, e semelhança de um raio oucorisco»: Ibant et revertebantur in similitudinem fulgoris coruscantis. Pois seos animais iam e tornavam à semelhança de um raio, como diz o texto que quandoiam não tornavam? Porque quem vai e volta como um raio, não torna. Ir e voltarcomo raio, não é tornar, é ir por diante. Assim o fez o semeador do nossoEvangelho. Não o desanimou nem a primeira nem a segunda nem a terceira perda;continuou por diante no semear, e foi com tanta felicidade, que nesta quarta eúltima parte do trigo se restauraram com vantagem as perdas do demais: nasceu,cresceu, espigou, amadureceu, colheu-se, mediu-se, achou-se que por um grãomultiplicara cento: Et fecit fructum centuplum. Oh que grandes esperanças me dáesta sementeira! Oh que grande exemplo me dá este semeador! Dá-me grandesesperanças a sementeira porque, ainda que se perderam os primeiros trabalhos,lograr-se-ão os últimos. Dá-me grande exemplo o semeador, porque, depois deperder a primeira, a segunda e a terceira parte do trigo, aproveitou a quarta eúltima, e colheu dela muito fruto. Já que se perderam as três partes da vida,já que uma parte da idade a levaram os espinhos, já que outra parte a levarames pedras, já que outra parte a levaram os caminhos, e tantos caminhos, estaquarta e última parte, este último quartel da vida, porque se perderá também?Porque não dará fruto? Porque não terão também os anos o que tem o ano? Oano tem tempo para as flores e tempo para os frutos. Porque não terá também oseu Outono a vida? As flores, umas caem, outras secam, outras murcham, outrasleva o vento; aquelas poucas que se pegam ao tronco e se convertem em fruto, sóessas são as venturosas, só essas são as que aproveitam, só essas são asque sustentam o Mundo. Será bem que o Mundo morra à fome? Será bem que os últimosdias se passem em flores? -- Não será bem, nem Deus quer que seja, nem há-deser..."(Antonio VIEIRA.O Sermão da Sexagésima. www.ufscar.br/literatura).

- Não são todos os que irão se salvar (Mt.24:12,13),embora a salvação seja para todos (Jo.3:16;I Tm.3:4; Tt.3:11).

- A evangelização impõe uma atitude de misericórdia com temor, ou seja, épreciso que tenham verdadeiro amor pelas almas, sem o que todo esforço deevangelização será inútil. Somente o amor pelas almas permitirá quepossamos pregar o Evangelho e promovamos um consciente e abençoado programa dediscipulado e integração do novo convertido na igreja. Devemos pregar a Cristoe não nos prendermos a usos e costumes que, com o tempo, serão automaticamenteadotados pelo neoconverso, pois se houve real transformação, ele passa a serum filho de Deus, que não anda mais segundo a carne, mas segundo o Espírito (Rm.8:1,5,8,9).

OBS: "...Ao missionário e evangelista cabe respeitar as etnias,anunciar a graça salvadora em Cristo recebida pela fé, sem se preocupar comcostumes e comportamentos, desde que não firam a fé e os princípios doutrináriosfundamentais. É fruto da ignorância querer mudar o sistema de vida dos povos,como se isso fosse o motivo da salvação para eles. O justo viverá da fé, éCristo quem os salva e o Espírito Santo quem os convence do pecado, da justiçae do juízo. Cabe ao evangelista anunciar e ensinar as Boas-Novas e o resto,deixa por conta do Senhor..."(Osmar José da SILVA. Reflexões filosóficasde eternidade a eternidade, v.6, p.117)

- A evangelização não se traduz apenas por palavras, mas por uma atitude, umavida que demonstre Cristo ao pecador. Se o evangelizador não refletir a glóriade Deus em seu viver (II Co.3:3,7,8.18),de nada adiantarão as suas palavras, que serão vazias e despidas de qualquersignificação. Jesus assim procedeu (Jo.17:17-19).

OBS: Um texto do atual líder da Igreja Romana é elucidativo e demonstracomo temos de ter uma vida diferente dos demais homens. Ei-lo: "...O cristãoestá no mundo, mas não é do mundo (cf.Jo.17,16).A vida do cristão deve ser necessariamente diferente daquela de quem não tem fé.Sua conduta, seu estilo de vida, seu modo de pensar, de fazer uma opção, deavaliar as coisas e as situações são diferentes, pois acontecem à luz dapalavra de Cristo, mensagem de vida eterna...O cristão deve viver naperspectiva da eternidade. Por vezes a sua vida autenticamente cristã podesuscitar uma perseguição, aberta ou disfarçada...A certeza da eternafelicidade que nos espera dá força ao cristão para enfrentar as tentações eser paciente nas tribulações. 'Se me perseguiram, também a vós hão deperseguir'(Jo.15,20). Uma honra muitogrande !..." (JOÃO PAULO II. Meditações e orações, p.131).

Neste sentido, existe até a preocupação de como devemos evangelizar, poisesta tarefa não deve se confundir com a mesma atitude dos perdidos. Assim,respondendo a uma questão na Sala dos Professores deste "site" arespeito da prática que alguns "crentes" têm tido de montar"blocos carnavalescos" com o intuito de evangelismo, assim nosmanifestamos: "a evangelização não se confunde com a prática dos mesmosatos dos perdidos. naturalmente que se pode elaborar um projeto de evangelizaçãoem meio aos festejos carnavalescos, com o fim de atrair os foliões à salvação,mas isto não significa que devamos nós mesmos virarmos um bloco carnavalesco.se assim fosse, os que evangelizam em hospitais, deveriam virar doentes ? e osque evangelizam em presídios, deveriam se tornar delinqüentes ? Como sepercebe, a estratégia de evangelização não é a correta e esconde, muitasvezes, é lamentável dizer, uma desculpa para que haja a mistura com omundo".

- A sétima recomendação diz respeito ao aborrecimento da roupa manchada dacarne. Judas, aqui, enfatiza que o crente, embora deva amar o pecador, tem deaborrecer o pecado. Não é possível que se compactue com o pecado e não sepode, com a roupa manchada da carne, ou seja, com uma vida não purificada,querer-se pregar o Evangelho validamente. A passagem nos faz lembrar da situaçãodo sumo sacerdote Josué quando da construção do segundo templo (Zc.3:3-10),que somente recebeu as promessas de Deus e pôde servir após trocar as vestessujas pelas vestes limpas. Devemos nos limpar, nos santificar cada dia mais,pois não há como servir a Deus em pecado - Ap.22:11;Js.3:5.

OBS: "...O simbolismo dessa linguagem sugere-nos as seguintes idéias:1. A natureza pecaminosa é como um traje imundo, que nos cobre de poluição dacabeça aos pés. 2. Se persistirmos em ficar com tais vestes, provocaremos aira de Deus contra nós mesmos...3. Essa roupa pode ser tirada de nós, sendosubstituída pela nova natureza reta, as novas e limpas vestes. 4. Mas isso sópode ser feito com auxílio vindo de 'fora', devido ao poder divino, e não pornossos próprios esforços. A salvação é de graça; Deus é quem confere aoshomens o arrependimento e a fé, embora eles devam reagir favoravelmente, pois avontade humana contrária pode anular a influência divina. 5. O recebimento dasnovas vestes, isto é, a nova natureza, modelada segundo a natureza e a imagemde Cristo, nos confere a honraria dada por Deus, do mesmo modo que,anteriormente, nossas roupas imundas provocavam seu desprazer e ira. 6. Aoscrentes é ordenado, através do ministério evangelístico e da motivação doamor, que ajudem outros a trocarem suas vestes. Esse ministério é motivadopela abominação à carne e a todos os seus inevitáveis mausresultados...."(R.N. CHAMPLIN, NTI, v.6, p.348-9).


IV. A PRESERVAÇÃO DOS SANTOS

- Se o crente deve se santificar, ficar separado do pecado, como fazê-lo, se somos tão frágeis ? Judas dá a resposta, informando-nos de que Deus preserva os santos. - Jd.24

- Deus quer que todos os homens se salvem e a salvação é para todos, mas sabemos que nem todos se salvarão, porque nem todos crerão. Entretanto, aos que crerem, Deus se compromete em guardá-los de todo tropeço e de todo o mal até o momento da glorificação -Jo.6:37-40;10:26-29;17:6-9,12,14,15.

- A salvação, portanto, depende da decisão do homem de permanecer firme até o instante da glorificação, sendo certo que, se morrer antes daquele, na dimensão eterna a decisão que tiver feito prevalecerá (cf.Ez.18:21-32). Não há, portanto, predestinação nem tampouco se poderá argüir que qualquer pecado caracteriza a apostasia, o pecado de blasfêmia contra o Espírito Santo, que é o único pecado imperdoável (cf.Hb.10:26-29; Mt.12:31).

- Judas encerra a sua carta com uma linda doxologia, em que reafirma que Deus é o único Senhor, que Jesus é Deus e, portanto, igualmente, único (o que afasta a teoria dos gnósticos de que havia vários "aeons", ou seja, pessoas iluminadas que poderiam trazer conhecimento, que nada mais é que o conceito de "mestres ascensionais" propalado pela Nova Era nos nossos dias) e que só a Ele pertencem a glória, a majestade, o domínio e o poder, antes que houvesse tempo, no passado, no presente e durante toda a eternidade.

ESCLARECIMENTOS COMPLEMENTARES DO TEXTO DO COMENTÁRIO DA LIÇÃO OU DESTE ESBOÇO

Anatole France (1844-1924) - Escritor francês que se caracterizou por um forte ceticismo. Ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 1921.

Antonio Vieira (1608-1697) - Considerado o maior orador da língua portuguesa. Padre jesuíta, embora fosse português veio para o Brasil com sete anos de idade. Grande pregador, foi nomeado pregador da corte pelo rei de Portugal. Acabou perseguido pela Inquisição, tendo sido confessor da rainha da Suécia e, depois, vindo passar seus últimos dias no Brasil. Sua principal obra é "Sermões".

mantra - Do sânscrito. mantra, 'instrumento para conduzir o pensamento'. No tantrismo (religião sincrética, derivada do hinduísmo, do budismo e de cultos populares, e que se cristalizou por volta do séc. XV, caracterizada pela magia e ocultismo, associados a complexo simbolismo, à iconolatria e à prática iogue), fórmula encantatória que tem o poder de materializar a divindade invocada.



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