segunda-feira, 27 de junho de 2016

O PROFETA OSÉIAS

A vida familiar trágica de Oséias foi uma necessidade para que o profeta pudesse ter um ministério vigoroso, pois só assim poderia ele experimentar a profundidade e sublimidade do amor de Deus para com Israel.
INTRODUÇÃO

- Oséias é considerado, na tradição judaica, como o primeiro dos "profetas canônicos", ou seja, o mais antigo dos profetas que deixaram registradas por escrito as suas profecias. Embora esta consideração tradicional tenha sido desmentida pelos estudiosos, que vêem Jonas e Amós anteriores a Oséias, isto não deixa de ser um indicativo do vigor que se atribui à mensagem de Oséias.

- O ministério de Oséias representa um contraste que não é difícil, é até compreensível, diríamos mesmo uma necessidade nos verdadeiros servos de Deus : uma vida material difícil e tumultuada, mas que, ao invés de ser uma demonstração de derrota e desencanto, apresenta-se como uma manifestação da glória de Deus -Mt.5:16.

I. O PERÍODO ÁUREO DA PROFECIA HEBRAICA

- No período em que Oséias profetizou, tem início o auge do ministério profético em Israel, precisamente a época dos "profetas canônicos" ou "profetas literários", que somente findaria, após o retorno do exílio, com Malaquias. Mais um contraste: enquanto o povo caminha rapidamente para a apostasia, Deus Se revela de forma esplendorosa através destes servos de Deus. É, precisamente, o retrato dos últimos dias de nossa dispensação: ao lado da apostasia cada vez maior (cfr.Mt.24:10-12; ITm.4:1-3; I Jo.2:18,19), o Espírito Santo está, como nunca, operando através da Igreja(Mt.24:14; ITm.4:6-16; I Co.2:9-16; IJo.2:20-29).

OBS: "...A partir de meados do século VIII a.C. e prosseguindo até o período pós-exílio, os oráculos de um pequeno número de profetas, primeiro em Israel e depois em Judá, foram coligidos e passados às gerações posteriores em forma escrita...Eles são conhecidos como profetas 'de escrita' ou 'literários', o que pode levar a erro, pois os oráculos eram quase sempre transmitidos oralmente, e depois escritos por seguidores; o termo 'clássicos' refere-se à posição preeminente desses livros na história do judaísmo, sua excelência literária e caráter seminal....Ao contrário dos profetas populares, tais como Elias e Eliseu, os profetas clássicos de modo geral não profetizavam individualmente. Suas falas eram dirigidas ao povo como um todo por sua responsabilidade coletiva ante YHVH...eram pregadores não solicitados e impopulares, não raro perseguidos pelas autoridades. Largamente incompreendidos, pareciam sentir-se eles próprios fracassados...Não obstante, os primeiros profetas clássicos tiveram impacto e, com o correr do tempo, tiveram larga influência sobre o judaísmo e a civilização ocidental..." (JUDAICA, v.1, p.70)

- São profetas contemporâneos de Oséias: Isaías, que foi o maior revelador do Messias para o povo judeu, a ponto de seu livro ser chamado, pelos estudiosos da Bíblia, de "o evangelho do Antigo Testamento"; Miquéias, outro profeta que foi especialmente usado por Deus para revelar o Messias; Amós, que denunciou, ao lado de Oséias, o pecado no reino do norte(embora fosse do reino do sul).

OBS: "...A profecia clássica também merece ser chamada literatura porque esses profetas eram bons poetas. A improvisação poética perante ouvintes era antiga prática usual e Israel tinha uma desenvolvida tradição de salmos e outras formas que punham à disposição dos profetas muitos elementos e técnicas literárias. Os oráculos eram proferidos em forma de lamentações, enigmas, julgamentos, diálogos dramáticos, canções de escárnio e combinações desses gêneros. Os profetas exploravam com grande flexibilidade todos os recursos do paralelismo poético para extrair o significado de um verso com contrastes irônicos e crescendos dramáticos. Empregavam símiles, metáforas, jogos de palavras, personificação e outras figuras de linguagem, transformando aspectos concretos do meio e sistema social israelita em símbolos de experiência e aspiração religiosas universais..."( JUDAICA, v.1, p.70)

II. A POSIÇÃO DO LIVRO DE OSÉIAS NO CÂNON SAGRADO

- Denomina-se "cânon" ao conjunto dos livros que os estudiosos judeus e, mais tarde, os estudiosos cristãos, consideraram como sendo livros inspirados pelo Espírito Santo. O "cânon" do Antigo Testamento (na verdade, o "cânon judaico", pois para os judeus não há dois testamentos) foi definido por volta do século I de nossa era, mas começou a ser fixado desde o século VII a.C., quando foi compilado o Pentateuco.

- Oséias é o primeiro dos livros dos chamados "Profetas Menores", assim denominados pela pequena extensão de suas obras, livros que foram reunidos em um único livro na Bíblia judaica, o "Dodecapropheton" (doze profetas, em rego), como ficou conhecido o livro na versão grega (a Septuaginta).

- O conteúdo do livro do profeta Oséias foi anunciado no esboço nº 1, a quem remetemos os leitores.

III. A VIDA PESSOAL DO PROFETA OSÉIAS

- Oséias significa "salvação", sendo a mesma raiz da palavra Josué e Jesus, portanto. Aliás, o nome de Josué era Oséias(Nm.13:8; Dt.32:44).

- Pouco se sabe sobre a vida deste profeta, havendo quem identifique seu pai como sendo um príncipe rubenita (cfr. Os.1:1 e ICr.5:6), o que, entretanto, é mera especulação.

- Também há quem defenda que Oséias teria sido padeiro (cfr. Os.7:4-9) (posição de N.H. Snaith), o que é refutado por muitos, pois o livro demonstra que Oséias teve excelente educação, o que seria incompatível com o exercício de uma profissão humilde como a de padeiro.

IV. O ESTRANHO CASAMENTO DE OSÉIAS

- Fator que tem causado celeuma entre os estudiosos da Bíblia é a história do casamento de Oséias com uma prostituta, que é o fato que dá início ao livro deste profeta. Muitos não aceitam que um homem de Deus pudesse se casar com uma prostituta e, por isso, interpretam este texto como sendo uma alegoria ou procuram explicações, das mais variadas. Além das mencionadas pelo comentarista, podemos, ainda, mencionar as seguintes:
a) que entende que Oséias teria recolhido Gomer como uma de suas concubinas, como entendeu Tomás de Aquino, mas que, igualmente, não pode ser levada em consideração, pois não há qualquer elemento no texto que permita tal indução.

b) que entende que a mulher mencionada no capítulo terceiro de Oséias não é Gomer, mas outra mulher, uma segunda esposa, daí porque teria sido segregada antes da união com o profeta( cfr.Dt.21:15-17). É a posição de Snaith. É, todavia, uma interpretação que não explica a aplicação do caso concreto às profecias que estarão na seqüência do livro.

c) que entende que Oséias teria sofrido de 'obsessão do sexo' em sua juventude e, por isso, teria se casado com uma prostituta, o que seria 'uma ilustração da luta entre a obsessão subsconsciente e a pureza do pensamento consciente, o que resultou no fato de ele ver-se envolvido naquilo que mais aborrecia' (Oesterley e Robinson). Entretanto, Heavenor, que é quem apresenta esta posição no Novo Dicionário da Bíblia(edição em um só volume, p.1159), considera-a "uma ilustração de como se pode enxertar as categorias do moderno estudo psicológico no texto da Bíblia", dizendo não haver a menor evidência no livro do profeta desta suposta obsessão, sendo que o desgosto do profeta com as extravagâncias sexuais de Israel era tipificamente profética, ou seja, fazia parte da própria mensagem dada por Deus a Israel, nada mais sendo do que a condenação da idolatria reinante.

d) que entende que Gomer teria sido uma prostituta cultual, ou seja, uma mulher que se dedicava à prostituição nos cultos de fertilidade de Baal e Asera, que resolvera abandonar este modo de vida e se casar com Oséias mas que, posteriormente, não resistiu e retornou à vida antiga.

OBS: "...Há forte probabilidade de que Gomer não fosse prostituta por ocasião de seu matrimônio, tendo posteriormente se voltado ao adultério e à imoralidade, talvez como prostituta no templo de Baal. Ao abandonar ao Senhor, ela não somente foi levada à adoração falsa, mas também ao rebaixamento dos padrões morais. Hoje se pode ver o mesmo padrão de vida imoral sempre que o povo de Deus se desvia da genuína dedicação ao Todo-Poderoso..."( Bíblia de Estudo Pentecostal, nota aOs.1:1, p.1273)

- O que existe, de pronto, é um dogmatismo, ou seja, um preconceito de estudiosos da Bíblia que vêem no histórico do casamento de Oséias uma ofensa a princípios que, na verdade, não foram inobservados. Deus mandou que Oséias se casasse com Gomer, mas isto não era pecado, pois não mandou que fornicasse ou se prostituísse com a mulher, mas que com ela se casasse. Neste casamento, não havia, portanto, já que não conste que Gomer fosse casada, qualquer pecado. Raabe, outra meretriz mencionada na Bíblia, consta, inclusive, da genealogia de Jesus(Mt.1:5).

- Não é por isso, entretanto, que iremos dizer que um cristão possa se casar com uma prostituta, se esta não deixou sua vida de pecados, pois não pode haver, entre nós, o jugo desigual, visto que não há comunhão entre a luz e as trevas - II Co.6:14-18.

- Oséias recebeu um mandado divino para se casar com Gomer, que, certamente, deixou a vida de prostituições, embora, pouco depois, retornasse a esta vida, tudo isto com um propósito: o de demonstrar a infidelidade espiritual de Israel bem como o grande amor de Deus.

- Oséias foi o primeiro profeta a figurar o relacionamento de Deus com o Seu povo com o casamento, o primeiro a apresentar como base do relacionamento entre Deus e o homem como sendo o amor, o que, posteriormente, seria largamente utilizado para se referir tanto a Deus com Israel, como entre Cristo e a Igreja (cfr.Ef.5:22-32, Ap.19:7;22:17)

OBS: "...Oséias foi o primeiro profeta a fazer largo uso do adultério como metáfora da infidelidade de Israel a YHVH. A infiel mulher de Oséias é apresentada duas vezes (caps.1 e 3) como símbolo alegórico do afastamento do povo da religião. YHVH é o marido enganado; Israel é a adúltera que deve ser punida por ingratidão. O povo busca outros 'amantes', os Baals (deuses cananeus), atribuindo-lhes a fertilidade na agricultura e outros favores concedidos pelo próprio YHVH..."(JUDAICA, v.1, p.75)

- Os filhos deste trágico relacionamento também receberam nomes proféticos, a saber: Jezreel, que quer dizer, "Deus espalhará". Era o anúncio do término da dinastia de Jeú, que se consolidara em Jezreel , mas sem que houvesse observância da palavra do Senhor. Não só a dinastia, mas o próprio reino seria destruído não muito tempo depois da queda desta casareal(Dt.28:62-68); Ló-Ruama, que quer dizer "não compadecida", demonstra que o povo de Israel seria destruído sem compaixão de Deus, visto que não atendera ao seu chamado para oarrependimento(Ex.33:19; Rm.9:15,16); Ló-Ami, que quer dizer "não-meu-povo", apontava para o término do pacto entre Deus e Israel, em virtude da infidelidade, a prenunciar o surgimento de um novo povo que passaria a ter a bênção de Deus (cfr.Mt.21:33-46; Jo.1:11-13;Rm.9:24-33).

OBS: "...Os filhos de Oséias recebem nomes simbólicos. O primeiro, 'Jezreel', é assim chamado pelo lugar em que Jeú massacrou a família do rei Acab(2 Reis 10:11), feito violento que o profeta presumivelmente desaprova. O segundo, 'Sem Misericórdia', significa que Deus já não pode amar seu povo'; o terceiro, 'Não meu povo', é expressão da total condenação de Deus..." (JUDAICA, v.1, p.75).
"...Acredita-se que o terceiro filho de Gomer, um menino chamado 'Lo-Ami' (que significa 'não meu povo') não fosse de Oséias. O nome da criança simbolizava a quebra do relacionamento pactual em conseqüência da contínua rebelião contra Deus mediante a idolatria. O povo do Reino do Norte já não poderia esperar que Deus oabençoasse e o livrasse de seus adversários. Oséias estava aprendendo, através de sua própria angústia, sobre como se achava o coração de Deus por causa dos pecados do povo."( Bíblia de Estudo Pentecostal, nota a Os.1:9, p.1273)
"...Notar a progressão nos três nomes: 'Jezreel', julgamento ativo; 'Lo-Ruama', passiva tolerância'; 'Lo-Ami', sem relacionamento." (Bíblia de Estudo Plenitude, nota a Os.1.9, p.853)

- Este episódio nos mostra, com absoluta clareza, que o fato de Deus ser bom, amoroso e misericordioso, em nada altera o caráter de Deus como um Ser justo e que executa juízo sobre os impenitentes. Deus é amor, mas também é justiça. Deus ama o pecador, mas abomina o pecado e não tem o culpado por inocente. Por isso, agora, na dispensação da graça(Ef.3:1-12), oferece uma tão grande salvação na pessoa de Jesus Cristo, imerecida mas resultado de seu grande e imensurável amor(Jo.3:16; Rm.8:35-39;Ef.3:14-19; Lc.4:14-21). Entretanto, depois de passada esta oportunidade, haverá o juízo de Deus, sem misericórdia, aos que rejeitarem a Jesus(Is.61:2b; Mt.25:11,12,30,41-46;Hb.2:1-4; Ap.6:16,17;11:18; 14:7-10;15:1).

OBS: "...O nome 'Lo-Ruama' (lit. 'não é compadecida' ou 'ela não recebe compaixão e amor') significa que Deus, em Sua santidade, declarara ter chegado a hora de cessar a sua longanimidade e acionar a Sua justiça. O juízo finalmente teria de vir contra o povo pecaminoso e rebelde." (Bíblia de Estudo Pentecostal, nota aOs.1:6, p.1273)


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